Em série

Enfileiradas, caminham até seus postos. Atravessam o dia, em ritmo automático-fordista, confundindo a linha de montagem de produto com a do próprio trabalhador. O ângulo captado pelo artista foge do close, dribla as expressões – ou talvez nem houvessem expressões a serem captadas. Afinal de contas, a despersonalização está por tudo, nas roupas, na serialidade, na homogeneização da massa. Toda essa dessubjetivação contagia a assepsia do galpão.

Mas há uma potência visual em meio a toda esse regramento. Há uma estética que nos seduz, que nos ilude: um sistema que nos lubridia na sua astúcia. A diagramação das economias e das coisas alcança sua ordem e encanto para encobrir suas entranhas.

Memorándum, palavra de origem latina, acarreta um caráter oficial e protocolar, fazendo menção ao termo utilizado pelas autoridades sobre assuntos de interesse público. Assim, temos aí uma homenagem implícita à esfera social trabalhadora – traço recorrente na produção de Héctor Zamora –, ao mesmo tempo em que se percebe a crítica às condutas mecânicas, consequentes da imposição de um modelo capitalista que apaga a humanização desses corpos femininos. Esses mesmos corpos, invisibilizados pela sua estandardização, são ali motores de energia e produção. São, portanto, dignos de memória.

por PAOLA FABRES