Rafael RG

Guarulhos, 1986. Vive em Belo Horizonte

Em formato de seminário, Ano passado eu morri, mas esse ano eu não morro foi pensado durante a residência de Rafael RG em Sorocaba. Teve como ponto de partida documentos encontrados ao acaso junto ao Arquivo Público Municipal de São Paulo referentes correspondências entre o artista Victor Brecheret (1894-1955) e a Secretaria Municipal de Cultura de São Paulo (SMC) por conta de uma dívida da entidade com o artista. A partir do encontro com esse material, RG redigiu um texto teatral junto a um ator de Sorocaba, escolhido por meio de convocatória aberta, que reflete sobre questões relativas à remuneração artística, à relação entre criação e ofício e à paixão, pelo outro ou pelo próprio trabalho.

As economias do afeto no trabalho de arte e os limites entre o prosaico e a formalidade são temas constantes para RG. Em suas exposições, costuma aliar documentos (pessoais ou de arquivos) com dinâmicas que criam laços, como convocatórias, convites para um encontro amoroso ou oficinas. Desta maneira, mescla questões da ordem do desejo com o próprio trabalho, além de ironizar os modos muitas vezes frios e impessoais do sistema da arte. Durante sua residência em Frestas, RG também propôs a oficina Esqueça o futuro – arte contemporânea como solução para problemas amorosos e outros tipos de problemas, na qual estimulou os participantes a pensarem intervenções para a cidade de Sorocaba a partir dessa chamada de autoajuda. Já em O momento presente encenou dramaturgias curtas e não anunciadas nos espaços de convivência do Sesc.

Cleverson Salvaro

A análise do contexto expositivo costuma ser o primeiro passo de Cleverson Salvaro para elaborar suas obras, que dizem muito sobre a conjuntura geográfica, econômica, social e cultural dos lugares que habita. Em Frestas, Salvaro é artista residente e desenvolve uma proposta de intervenção urbana e expositiva com restos de construções, pedras e outros materiais encontrados pela cidade. Tal ação partiu da impossibilidade de realizar um outro projeto: a construção de uma ruína monumental no terreno apelidado de Trevo da Morte pelo alto índice de acidentes, na estrada que liga as cidades de Sorocaba e Votorantim. Sua investigação remete a discussões sobre território e fronteira, porém carrega um dado mais específico em sua localização. Durante anos, houve disputa judicial entre os dois municípios pela retenção dos impostos do Shopping Esplanada, edificado na divisa de ambos.

A escultura proposta também remeteria a outro imbróglio de Sorocaba: uma estrutura de cerca de vinte metros de altura conhecida pela população local como Aranha do Vergueiro. Erguida originalmente na década de 1960 para ser uma grande igreja, a construção de concreto lembra uma aranha e encontra-se abandonada. Salvaro planejou realizar sua escultura em camadas, de modo que pudesse ser abandonada assim que os recursos destinados à construção se esgotassem. A obra foi idealizada para ser largada ainda incompleta – sua descontinuidade seria intencional e sua concepção se originou na perspectiva de falência do projeto. Com a impossibilidade de ocupar o local desejado por questões de segurança, as ruínas deste monumento que sequer existiu foram de uma vez espalhadas por pontos da cidade e pela exposição, desmanchando-se no tempo e no espaço de Frestas e Sorocaba.

Fabiano Marques

Santos, 1970. Vive em Berlim

Durante a ditadura militar, entre 1976 e 1978, Fabiano Marques morou em Sorocaba. Na época, seu pai era juiz e sua mãe, professora de geometria. A memória da cidade e o desejo de refletir sobre o papel do poder judiciário na situação política atual do país, à luz da leitura crítica de acontecimentos passados, unem-se na possibilidade de investigar, com um grupo de estudantes de direito, processos julgados naquele período de sua infância.

Em Os processos (2017), Marques trabalha em colaboração com estudantes e professores da Universidade Paulista (Unip) de Sorocaba para selecionar e escrever sinopses e vereditos para os autos dos livros de registros da 1a Vara do Fórum de Sorocaba. O objetivo é anexar esse material ao arquivo oficial, tornando-o acessível à consulta pública,algo ainda não realizado com a documentação do período.

Libra (2017) consiste em uma escultura em metal que, instalada de modo a poder ser vista contra o céu, aponta para a constelação cujo nome pega emprestado. Na obra, as estrelas se convertem em vértices ligados por linhas com medidas proporcionais às de suas respectivas distâncias da Terra. A distorção pela perspectiva a aproxima da forma cônica de um telescópio e recoloca a questão da parcialidade da visão, sempre estabelecida a partir de um lugar.

[Y.R.]

Obras

Libra, 2017
ferro
CONSULTORIA DE ASTRONOMIA Martha Terenzzo e Axel Jaccobs
AUTOCAD Gabriela Lessa

Os processos, 2017
WORKSHOP COORDENAÇÃO JURÍDICA Elisa Rosa
PARTICIPANTES alunos do curso de Direito da Faculdade Unip de Sorocaba