Fábio Noronha

Curitiba, 1970

Interessado nas “sujeiras” da codificação nos programas de computador e na linguagem da internet, com seus links, pop-ups e anúncios, o artista articula escrita, imagens digitais, vídeo, som, instalação e projetos editoriais. A apropriação de materiais da internet se faz método para a construção de um repertório que frequentemente se desenvolve por meio de edição e montagem. É sobretudo nesse ambiente digital que Noronha faz circular sua produção, disponibilizando-a gratuitamente para visualização e download.
Na Trienal, o artista apresenta três edições da revista Arminha, projeto editorial que desenvolve em sua pesquisa na universidade, e um conjunto de seis vídeos que congregam parte do vocabulário poético que construiu nos últimos anos.
Em Audio 65 a (2002), a leitura computadorizada de uma versão do texto Electronic Revolution [Revolução eletrônica] (1970), de William S. Burroughs, é ilustrada por uma imagem de fita cassete, o que evoca os experimentos com gravação e também ideias sobre a relação entre palavra escrita e falada.
Já no vídeo Megafone (2016), uma montagem com trilha sonora composta pelo artista mostra um a um, na forma de legenda, os 198 métodos de ação não violenta compilados por Gene Sharp, estadunidense que publicou uma série de estudos sobre estratégias de resistência em contextos de ditadura, opressão e guerra.

Obras

Megafone, 2016
vídeo digital, cor, som estéreo, 16’50”

Audio 65 a, 2002
vídeo digital, cor, som mono, 66’8”

Barba eXistenz, 2012
vídeo digital, cor, som estéreo, 54”

Vídeo-anúncio SCC_var_
Bouguereau, 2013
vídeo digital, cor, som estéreo, 9’2”

Cabeça, da série Insônia
valeriana, 2000/2002
vídeo, 1’38”

Banho personal 1950, 2006
vídeo, 5’30”

Revista Arminha V1: Insônia
Valeriana, 2015
Revista Arminha V2: Motosserra,
2016
Revista Arminha V3: Coded
Meaning, 2017

Reynier Leyva Novo

Havana, 1983

Em esculturas, instalações e vídeos, Reynier Leyva Novo problematiza a história de Cuba, sem no entanto esquecer suas relações com uma geopolítica mundial. Na produção audiovisual, como na trilogia El país que soñó ser continente [O país que sonhou ser continente] , o artista já investigou a perspectiva de outros contextos sobre seu país natal. Desta maneira, reuniu indícios para pensar um Sul global – mais do que uma região geopolítica, um conceito em disputa, no que concerne a identidades, territórios e memórias.

Na Trienal, Leyva Novo apresenta duas instalações, que, apesar de anteriores, ganham contornos específicos. Em Arqueologia de una sonrisa [Arqueologia de um sorriso] (2015/2017) por volta de 2,5 mil escovas foram coletadas por meio de trocas com a população de Sorocaba: ao entregarem as escovas usadas ao artista, as pessoas receberam uma nova. Disposta sobre a parede, a coleção angariada permite ver variações de cor, tamanho e desgaste. Já El beso de cristal [O beijo de cristal] (2015) consiste em setenta taças com gravações a laser dos retratos, nomes e tempos de mandato dos 24 presidentes cubanos e 44 presidentes estadunidenses (antes da eleição de Donald Trump, o 45º, eleito em 2016). Completam o conjunto duas taças limpas, sem gravações, na época à espera do nome dos futuros líderes desses países (os EUA elegeram Donald Trump). Se em Arqueologia… o artista evoca as subjetividades em nome de uma memória coletiva, em El beso… remonta aos símbolos de poder em Cuba e nos Estados Unidos, também em referência a uma representação coletiva de nações que têm entre si uma história de disputas ideológicas.

Obras

The Crystal Kiss [O beijo de cristal], 2015
globos de vidros gravados a laser

Archeology of a smile [Arquelogia de um sorriso], 2017
escovas de dente, retratos e informações pessoais
FOTOGRAFIAS Camila Fontenele
AGRADECIMENTO Pastoral do Menor de Sorocaba
Centro Educacional Comunitário Habiteto

Raul Mourão

Rio de Janeiro, 1967. Vive entre Rio de Janeiro e Nova York

Passagem (2010) é uma instalação que relaciona dois objetos recorrentes nas pesquisas de Raul Mourão: as grades e os balanços ou cinéticos, ambos nas mais variadas escalas e formas. Essa obra, constituída por uma estrutura metálica que compõe uma área retangular, permite que o espectador entre e acesse alguns balanços. Se pode brincar com a obra, contrariando os vetos que costumam ordenar espaços expositivos. A interatividade também caracteriza Playground, cinético que está instalado no terraço do Sesc Sorocaba. Dentro da mostra, o artista reúne em uma vitrine parte da longa série fotográfica na qual documenta a presença das grades que se proliferam no espaço urbano, como uma espécie de “apêndice” acoplado muitas vezes tardiamente à arquitetura dos edifícios.

Obras

Passagem, 2010
aço e resina sintética

Sem título, 1998-2002
aço, fotografias, madeira e vidro

Michael Wesely

Munique, 1963. Vive em Berlim

Formado ainda nos tempos da Guerra Fria, o fotógrafo viveu processos drásticos de transformação espacial, social e cultural de seu país. Com isso, desenvolveu uma acurada percepção de tempo e de processos de recuperação histórica. Munido de câmeras pinhole, Michael Wesely passou a experimentar a superexposição de filmes em processos fotográficos analógicos de longa duração. Capturou, dessa maneira, imagens que acumulam agentes e disputas vivenciados na contemporaneidade. Entre 1997 e 1999, o artista documentou a reconstrução da Potsdamer Platz, em Berlim, revelando o início de um processo de especulação até hoje vigente sobre aquela paisagem.

Familiarizado com a realidade política brasileira, Wesely apresenta em Frestas quatro fotografias de um conjunto maior, feito em 17 de abril de 2016 – dia em que a Câmara dos Deputados votou pela admissibilidade do impeachment da presidenta Dilma Rousseff, eleita em 2014. Em suporte digital, mas ainda fazendo uso da técnica de superexposição, o artista registrou os movimentos populares em dois espaços públicos tradicionais de São Paulo. No vale do Anhangabaú, reuniram-se os que eram contra o afastamento de Dilma, enquanto na avenida Paulista havia um grupo a favor da condenação que por fim interrompeu o mandato presidencial. As fotografias remetem à cisão democrática e à crise política vivenciadas no Brasil de hoje. Entre sobreposições e manchas de movimentos desordenados, configura-se um momento histórico que tardará por ser assimilado.

Hello

Vale do Anhangabaú, 2016
(18.12 – 18.24 Uhr, 17.4.2016)
c-print

Vale do Anhangabaú, 2016
(17.04 – 18.12 Uhr, 17.4.2016)
c-print

Avenida Paulista, 2016
(19.37 – 19.57 Uhr, 17.4.2016)
c-print

Avenida Paulista, 2016
(20.17 – 20.34 Uhr, 17.4.2016)
c-print

Marko Lulić

Viena, 1972

Tendo em mente o contexto histórico europeu desde o pós-guerra, marcado pela consolidação do modernismo em suas mais variadas formas de representação, Marko Lulic produz vídeos em que registra ações performáticas em lugares onde existem esculturas e arquiteturas monumentais. Esses elementos evocam a diversidade ideológica e estética das formas progressistas do moderno, presentes de maneiras distintas tanto em países capitalistas quanto socialistas.

Seus filmes, como Kosmaj Monument [Monumento Kosmaj] (2015) e Proposal for a Workers’ Monument [Proposta de um monumento para os trabalhadores] (2014), promovem, cada um a sua maneira, interseções entre monumento e dança, uma lembrança estática e a tentativa de entendê-la com o corpo e pelo movimento. Filmadas, respectivamente, na montanha Kosmaj, na Sérvia (antiga Iugoslávia), e em Berna, na Suíça, as obras demonstram como bailarinos, ora improvisando ora executando coreografias, podem ativar espaços e trazer à tona suas particularidades históricas, arquitetônicas e sociais. Nestes e nos demais filmes exibidos no Frestas, realizados em outras locações, o corpo dialoga com a arquitetura para alcançar possíveis respostas ao que se consolida como lembrado ou esquecido na memória coletiva.

Obras

Model of Relations (The Circle)
[Modelos de relação (o círculo)], 2015
vídeo, 11’
CORTESIA da Gabriele Senn Gallery e do artista.
PRODUZIDO em colaboração com Kuehn Malvezzi e seu
projeto Models of the House of One, Bienal de Arquitetura de
Chicago, 2015

Kosmaj Monument [Monumento
Kosmaj], 2015
vídeo, 9’48”
CORTESIA da Gabriele Senn Gallery e
do artista

Proposal for a Workers’ Monument
[Proposta de um monumento
para os trabalhadores], 2014
vídeo, 10’25”
CORTESIA da A da Gabriele Senn Gallery e do artista

Space-Girl Dance [Dança da
garota-espacial], 2009
vídeo, 3’
Coleção da Aksenov Family Foundation
CORTESIA da Gabriele Senn Gallery e
do artista

Jasenovac, 2010
vídeo, 9’
CORTESIA da Gabriele Senn Gallery e do artista

MARKO LULIĆ
Model of Relations (The Circle)
[Modelos de relação (o círculo)], 2015
vídeo, 11’
CORTESIA da Gabriele Senn Gallery e do artista.
PRODUZIDO em colaboração com Kuehn Malvezzi
e seu projeto Models of the House of One, Bienal
de Arquitetura de Chicago, 2015

Letícia Ramos

Santo Antônio da Patrulha, 1976. Vive em São Paulo

A produção de Letícia Ramos tem algumas características recorrentes: o domínio completo do fazer fotográfico e fílmico, o feitio artesanal dos dispositivos de captação de imagens, a precisão construtiva e, por fim, a maneira de tecer uma narrativa ficcional ambígua, que se confunde com as ditas “verdades” da ciência e da história. Sua formação em arquitetura e cinema, além de um vasto repertório em ficção científica, colaboram para a determinação do universo poético da artista.

Em Grão (2016), Ramos transporta o espectador para o futuro. Devido a uma catástrofe, uma colônia humana em outro planeta parece entrar em desequilíbrio. O rompimento de um silo deflagra um estranho cultivo e aparentemente incontrolável. O cenário dessa trama foi feito em escala reduzida de maquete. Nas filmagens, a paisagem em miniatura tornou-se um ambiente inóspito, que se intercala com imagens de pequenos detalhes obtidos com base na macrofotografia de fenômenos biológicos. Na Trienal, a artista também faz uso de holografia e desenhos para representar um meteorito que parece advir de uma história pregressa de Sorocaba. Como uma peça de museu arqueológico e etnográfico, o corpo celeste remonta a outros tempos, perturbando a realidade e desconstruindo o presente.

[D.M.]

Obras

Meteorito em suspensão, 2017
Desenho, colagem e maquete holográfica

Grão, 2016
16 mm transferido para vídeo, full HD, 8’

Héctor Zamora

Cidade do México, 1974. Vive em Lisboa

Somando a formação em design gráfico com o interesse por arquitetura e artes visuais, Héctor Zamora começou nos anos 2000 sua carreira, da qual passou grande parte em São Paulo. Sua obra atenta para a realidade social e econômica em países do capitalismo periférico. Em suas performances, geralmente registradas em vídeo, costuma observar arcaísmos, desequilíbrios, dissensos e vulnerabilidades que são comuns ao Brasil e ao México, dois lugares onde a vivência do artista permitiu aprofundar a percepção dos fatos.

Memorándum [Memorando] (2017) é um videorregistro. Sobre uma estrutura de andaimes composta de diversos patamares, encontram-se mulheres uniformizadas e sentadas. Elas datilografam sem parar e as folhas que resultam de seu trabalho são paulatinamente arremessadas ao centro do vão circundado pelos andaimes. Pouco tempo é necessário para instaurar-se uma situação que evidencia a violência a que as mulheres são submetidas em um sistema produtivo machista, por estarem durante muito tempo limitadas à condição de assistentes e de executoras de ordens. Já em Ordre et progrès [Ordem e progresso] (2016), uma videoinstalação em três canais, trabalhadores com seus capacetes e marretas destroem simultaneamente alguns barcos pesqueiros populares, transformando-os em volumes consideráveis de entulho e ruínas. Em nome de aprimoramento técnico, o trabalho, a repetição, o descarte e o desperdício parecem estabelecer-se como gestos inquestionáveis de uma ordem laboral. É nesse tensionamento entre a preservação do que existe e o imperativo do novo que Zamora acentua um impasse do sistema capitalista, que tende ao apagamento de uma memória coletiva. Os resquícios da performance atestam um conhecimento ou uma produção material que não se deveria perder de vista.

Obras

Memorándum [Memorando], 2017
videoinstalação, 4’14”, 48 datilógrafas, 48 máquinas de escrever,
48 escrivaninhas, papel, andaime
CORTESIA do artista e da Galeria Luciana Brito
EDIÇÃO Visual Mates

Deborah Engel

Palo Alto, 1977. Vive no Rio de Janeiro.

Observar fenômenos arquitetônicos que permeiam a vivência na cidade é um gesto recorrente na trajetória de Deborah Engel. Com técnicas de colagem de fotografias e impressos em escalas e espessuras variadas, a artista cria tridimensionalidade e ilusionismo. As peças que Engel apresenta em Frestas dão a impressão de que se está diante de diferentes espaços arquitetônicos, dos quais tentam representar passagens, intervalos e circulações. As obras se projetam da parede para o espaço expositivo. Construídas da sobreposição de uma mesma imagem, sugerem movimento e potencializam a dualidade entre finitude e infinitude.


Obras

Escada escala, 2017
colagem

Equinócio, 2017
colagem

André Komatsu

São Paulo, 1978

Parte de uma geração de artistas paulistanos que desde a virada dos anos 2000 investiga modos de pensar a esfera pública, André Komatsu concebe trabalhos de forte carga matérica e construtiva, que decodificam, no tempo e pela ação, noções estanques de espaço aos quais estamos habituados. O artista também lança mão de um amplo e heterogêneo vocabulário conceitual e formal, que tenciona as relações de poder e as negociações inerentes ao convívio em ambientes urbanos.

Do início da carreira, Oeste ou até onde o sol pode alcançar (2006) é uma performance registrada em vídeo. O próprio Komatsu percorre de maneira hercúlea um trecho longo na cidade de São Paulo, na tentativa de acompanhar integralmente o trajeto do sol, do extremo leste ao extremo oeste do perímetro urbano. Além desta obra, um projeto inédito foi pensado para uma praça de Sorocaba, em frente à rodoviária. Feita em ferro, vidros e espelho, a estrutura conjuga opostos como contenção e abertura, passagem e impedimento, vista e opacidade, público e privado.